domingo, setembro 28, 2008

 

Crise Americana: forma didática para a compreender


Paul comprou um apartamento, no começo dos anos 90, por 300.000 dólares financiado em 30 anos. Em 2006 o apartamento do Paul passou a valer 1,1 milhão de dólares. Então, um banco perguntou ao Paul se ele não queria algum dinheiro emprestado, algo como 800.000 dólares, dando seu apartamento como garantia. Ele aceitou o empréstimo, fez uma nova hipoteca e pegou os 800.000 dólares. Com os 800.000 dólares, Paul, vendo que imóveis não paravam de valorizar, comprou 3 casas em construção dando como entrada algo como 400.000 dólares. A diferença, 400.000 dólares que Paul recebeu do banco, ele se comprometeu: comprou carro novo (alemão) pra ele, deu um carro (japonês) para cada filho e com o resto do dinheiro comprou bens como, por exemplo, tv de plasma de 63 polegadas, 43 notebooks, 1634 peças de vestuário. Tudo financiado, tudo a crédito. A esposa do Paul, sentindo-se rica, usou e abusou do cartão de crédito. Em Agosto de 2007, começaram a correr boatos que os preços dos imóveis estavam caindo. As casas que Paul tinha dado entrada e estavam em construção caíram vertiginosamente de preço e não tinham mais liquidez. O negócio era refinanciar a própria casa, usar o dinheiro para comprar outras casas e revender com lucro.
Fácil... parecia fácil.
Só que todo mundo teve a mesma ideia ao mesmo tempo. As taxas que o Paul pagava começaram a subir (as taxas eram pós fixadas) e o Paul percebeu que seu investimento em imóveis se transformara num desastre. Milhões tiveram a mesma idéia do Paul. Tinha casa para vender como nunca. Paul foi aguentando as prestações da sua casa refinanciada, mais as das 3 casas que ele comprou, como milhões de compatriotas, para revender, mais as prestações dos carros, as das peças de vestuário, dos notebooks, da tv de plasma e do cartão de crédito. Então as casas que o Paul comprou para revender ficaram prontas e ele tinha que pagar uma grande parcela. Só que nesse momento Paul achava que já teria revendido as 3 casas, mas ou não havia compradores ou os que havia só pagariam um preço muito menor que o Paul havia pago.
Paul se encalacrou. Começou a não pagar aos bancos as hipotecas da casa que ele morava e das 3 casas que ele havia comprado como investimento. Os bancos ficaram sem receber dos milhões de especuladores iguais ao Paul. Paul optou pela sobrevivência da família e tentou renegociar com os bancos que não quiseram acordo. Paul entregou aos bancos as 3 casas que comprou como investimento, perdendo tudo o que havia investido. Paul quebrou. Ele e sua família pararam de consumir. Milhões de Pauls deixaram de pagar aos bancos os empréstimos que haviam feito baseado nos preços dos imóveis. Os bancos haviam transformado os empréstimos de milhões de Pauls em títulos negociáveis. Esses títulos passaram a ser negociados com valor de face. Com a inadimplência dos Pauls, esses títulos começaram a valer pó. Milhões e milhões em títulos que passaram a nada valer estavam disseminados por todo o mercado, principalmente nos bancos americanos e em bancos europeus e asiáticos. Os imóveis eram as garantias dos empréstimos, mas esses empréstimos foram feitos baseados num preço de mercado desses imóveis, preço esse que despencou. Um empréstimo que foi feito baseado num imóvel avaliado em 500.000 dólares, de repente passou a valer 300.000 dólares, e mesmo pelos 300.000 não havia compradores. Os preços dos imóveis eram uma bolha, um ciclo que não se sustentava, como os esquemas de pirâmide, especulação pura. A inadimplência dos milhões de Pauls atingiu fortemente os bancos americanos que perderam centenas de milhões de dólares.
A farra do crédito fácil um dia acaba. Acabou. Com a inadimplência dos milhões de Pauls, os bancos pararam de emprestar por medo de não receber. Os Pauls pararam de consumir, porque não tinham crédito. Mesmo quem não devia dinheiro não conseguia crédito nos bancos e quem tinha crédito não queria dinheiro emprestado. O medo de perder o emprego fez a economia travar. Recessão é sentimento, é medo. Mesmo quem pode, pára de consumir. O FED começou a trabalhar de forma árdua, reduzindo fortemente as taxas de juros e as taxas de empréstimo interbancários. O FED também começou a injectar milhões de dólares no mercado, provendo liquidez. O governo Bush lançou um plano de ajuda à economia sob forma de devolução de parte do imposto de renda pago, visando incrementar o consumo porém essas acções levam meses para surtir efeitos práticos. Essas ações foram correctas e, até agora, não é possível afirmar que os EUA estão tecnicamente em recessão. O FED trabalhava. O mercado ficava atento e as famílias esperançosas. Até que na semana passada o impensável aconteceu. O pior pesadelo para uma economia aconteceu: a crise bancária, correntistas correndo para sacar suas economias, boataria geral, pânico. Um dos grandes bancos da América, o Bear Stearns, amanheceu, na segunda-feira última, quebrado, insolvente. No domingo o FED, de forma inédita, fez um empréstimo ao Bear, apoiado pelo JP Morgan Chase, para que o banco não quebrasse. Depois disso o Bear foi vendido para o JP Morgan por 2 dólares por acção. Há um ano elas valiam 160 dólares. Durante esta semana dezenas de boatos voltaram a acontecer sobre quebra de bancos. A bola da vez seria o Lehman Brothers, um bancão. O mercado e as pessoas seguem sem saber o que nos espera na próxima segunda-feira. No dia 15 de Setembro 2008 o Lehman Brothers pediu falência, desempregando mais de 26 mil pessoas e provocando uma queda de mais de 500 (quinhentos) pontos no Índice Dow Jones, que mede o valor ponderado das acções das 30 maiores empresas negociadas na Bolsa de Valores de Nova York - a maior queda em um único dia, desde a Quebra de 1929.
O que começou com o Paul, hoje afecta o mundo inteiro. A coisa pode estar apenas começando. Só o tempo dirá.


(Eloína)

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