domingo, dezembro 23, 2007

 

Chamar-se-á Emanuel”

“Emanuel, que se traduz ‘Deus connosco’». Sim, Deus connosco! Até então, ele era «Deus acima de nós», «Deus frente a nós», mas agora é «Emanuel». Hoje ele é Deus connosco na nossa natureza, connosco na sua graça; connosco na nossa fraqueza, connosco na sua bondade; connosco na nossa miséria, connosco na sua misericórdia; connosco por amor, connosco pelo laço de família, connosco pela ternura, connosco pela compaixão…

Deus connosco! Vós, os filhos de Adão, não pudestes subir ao céu para estar com Deus; Deus desce do céu para ser Emanuel, Deus connosco. Ele vem até nós para ser Emanuel, Deus connosco, e nós, nós negligenciamos vir a Deus para estar nele! «Ó homens, até quando transformais a minha honra em desonra? Porque amais as vaidades e buscais a mentira?» (Sl 4,3) Aqui está a verdade que veio; «porquê amar o nada e procurar a mentira?» Aqui está o Emanuel, eis aqui Deus connosco.

Como poderia ele estar mais comigo? Pequeno como eu, fraco como eu, nu como eu, pobre como eu em tudo, ele veio semelhante a mim, tomando o que é meu e dando o que é seu. Eu jazia morto, sem voz, sem sentido; a própria luz dos meus olhos não estava mais comigo. Ele desceu hoje, este homem tão grande, «este profeta com poder em obras e em parábolas» (Lc 24,19). «Ele pousou o seu rosto sobre o meu rosto, a sua boca sobre a minha boca, as suas mãos sobre as minhas mãos» (2R 4,34) e fez-se Emanuel, Deus connosco!

(Aelrede de Rielvaux (1110-1167), monge de Cister Sermão para a Anunciação )

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Dia de Natal
(António Gedeão)

Hoje é dia de era bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

É dia de pensar nos outros— coitadinhos— nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.

Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,

Entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.

De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)

Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos, esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam mais distante.

Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica.

Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos e favores.

A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
e compra— louvado seja o Senhor!— o que nunca tinha pensado comprado.

Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.

Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha,
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama.

Ah!

Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.

Jesus
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.

Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem mortas:
Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.
Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.

E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.

Dia de Confraternização Universal,
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.

É dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.
 
Tu que dormes a noite na calçada de relento
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que dormes só no pesadelo do ciúme
Numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser

Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e comboios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um Homem quiser

Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

(Ary dos Santos)
 
NATIVIDADE

Em tempos estes de Advento,
(Re)Nascer é tema bem central;
Depois chega a noite toda especial,
Nenhuma outra noite tão magistral,
A importante Noite de Natal.
Nela não há lugar para o mal,
Aliás, é signo do bem total,
É marco do perdão real,
Para o pecado original.
Renove a sua alma imortal,
Readquira a sua opção moral,
O mundo atual é bem desigual,
De luta, labuta, disputa infernal,
A ganância é realidade imoral,
E o senso de honradez considerado anormal.
A cada ano, o Ser Celestial
Vê afastar-se o senso inicial.
Vamos lá! Tente ser imparcial,
De postura bem original:
Perdoe, renasça, faça o seu NATAL!
 

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